28/04/2017

Lição 05 – Jacó, um exemplo de caráter restaurado



 INTRODUÇÃO:

Nesta Aula trataremos de Jacó, neto de Abraão. Jacó possuía um caráter oportunista e usurpador, que levou a enganar o próprio pai. Mas, Jacó teve um encontro com Deus e foi transformado por Ele (Gn.32:30). Todo encontro com Deus é transformador, ninguém sai da Sua presença da mesma maneira que entrou.
Jacó marca o fim da era patriarcal com relação à origem da nação de Israel; ele é o último dos patriarcas de onde vieram as doze tribos de Israel. Sua vida ocupa uma grande porcentagem do livro de Gênesis, e é marcada por altos e baixos, erros, enganos, sofrimento, mudança e fidelidade a Deus

I. QUEM ERA JACÓ
  1. O filho mais novo de Isaque. O nascimento de Jacó foi um milagre. Sua mãe, Rebeca, era estéril. Isaque orou instantemente por vinte anos para que Deus abrisse a madre de sua mulher Rebeca (Gn.25:20,21,26) e Deus ouviu a sua oração. Rebeca engravidou e logo notou que havia gêmeos em seu ventre, que lutavam entre si (Gn.25:22), tendo, então, o Senhor, em resposta à oração de Rebeca, dito que havia duas nações no seu ventre e que o maior serviria o menor (Gn.25:23). No nascimento, Esaú nasceu primeiro, tendo sido chamado Esaú porque era cabeludo, sendo também chamado Edom, porque era ruivo, enquanto que o caçula foi chamado de “Jacó”, porque nasceu segurando no calcanhar de seu irmão, por isso, recebeu o nome de “Jacó”, que significa “suplantador” ou “aquele que segura pelo calcanhar”.
  1. O preferido de sua mãe. Isaque e Rebeca já sabiam de antemão que Jacó era o escolhido para dar seguimento à formação da grande nação prometida a Abraão e na qual seriam benditas todas as famílias da terra (Gn.12:1-3), e as circunstâncias do nascimento que levaram, inclusive, à concessão dos nomes aos filhos gêmeos, também já mostravam que Jacó ocuparia o lugar que, por direito, seria de seu irmão primogênito, mas, infelizmente, esqueceram-se de tal afirmação divina e se deixaram inclinar por suas predileções pessoais. Isaque preferia Esaú, porque seu comportamento lhe agradava, assim como Rebeca preferia Jacó também por causa da conduta de seu filho caçula – “varão simples, habitando em tendas” (Gn.25:27,28). Estas atitudes acabaram levando à própria destruição do lar do patriarca Isaque.
  1. O preferido de Deus. Deus em seus desígnios já havia escolhido Jacó, antes do seu nascimento, e revelado aos seus pais que o primogênito serviria ao caçula (Gn.25:23). Portanto, antes mesmo do seu nascimento, Jacó já fora escolhido por Deus para ser o herdeiro da promessa de Abraão (Ml.1:2; Rm.9:13). Tal escolha, porém, não significa, em absoluto, que haja uma predestinação incondicional, que Deus seleciona previamente quem será salvo e quem não o será. Deus não tem filhos privilegiados, nem escolhe uns para a salvação e outros para a condenação, pois tal atitude contraria frontalmente o seu caráter santo, justo e bom. Seria, portanto, uma terrível discriminação por parte de Deus que condena quem faz acepção de pessoas (Tg.2:9; Pd.1:17). Aqui, a escolha dizia respeito à formação da nação de onde viria o Salvador e, como a nação era formada diretamente por Deus, tinha Ele o pleno direito de escolher quem quisesse, sem que isto representasse parcialidade ou injustiça. Já a ideia da predestinação incondicional é incompatível com a assertiva bíblica de que Deus não faz acepção de pessoas (Dt.1:17; 10:17; At.10:34).
II. A DIREÇÃO DE DEUS NA VIDA DE JACÓ
“E eis que estou contigo, e te guardarei por onde quer que fores, e te farei tornar a esta terra, porque te não deixarei, até que te haja feito o que te tenho dito” (Gn.28:15).
Jacó se dispôs a obedecer aos seus pais e encarou a rota de fuga rumo a Padã-Harã (Gn.28:7), onde morava seu tio, Labão, cerca de 640 quilômetros de distância. Quando ia, ele parou num certo lugar e ali passou a noite, porque já o sol era posto, e tomou uma das pedras daquele lugar e a pôs por sua cabeceira e deitou-se (cf. Gn.28:11). Ali, Deus apareceu a Jacó e disse-lhe: “Eu sou o Senhor, o Deus de Abraão, teu pai, e o Deus de Isaque…” (Gn.28:13). Observe que Deus não lhe disse: “Eu sou o teu Deus”. Até aquele momento, Deus não era o Deus de Jacó. O conhecimento de Jacó acerca de Deus era apenas teórico; ele tinha apenas uma fé intelectual, que é uma fé morta.
Jacó foi escolhido por Deus, mas ainda não conhecia o Senhor pessoalmente. Jacó foi escolhido, mas não confiava na providência divina, por isso, em vez de confrontar seu pai acerca do propósito de Deus, mente para ele (cf.Gn.27:18-27). Jacó se tornou um enganador, um mentiroso, um falsário, um retrato de seu nome. Ele lidava com as coisas de Deus, mas sem o temor a Deus. Ele era um patriarca, mas não conhecia Deus pessoalmente. Uma coisa é crescer na igreja, pertencer a um lar cristão, ler a Bíblia e ser membro da igreja; outra coisa é ser nova criatura. Ninguém entra no céu por ser filho de crente, por ter nome de crente. Somente aqueles que nascem de novo, que nascem da água e do Espírito, podem entrar no Reino de Deus (João 3:3,5). Se não tivermos cuidado, Deus será apenas o Deus dos nossos pais, e não o Deus da nossa vida.
Apesar de sua fé teórica e ainda não conhecer de perto o Deus de Abraão e Isaque, o Senhor toma a iniciativa e revela-se a Jacó fazendo-lhe promessas grandiosas. Vejamos, a seguir, algumas dessas promessas.
  1. Deus lhe promete proteção e direção (Gn.28:15) – “….e te guardarei por onde quer que fores…”. Jacó agora tem segurança na jornada e propósito de vida. Ele sabe que Deus é seu refúgio e também seu alvo. Jacó agora pode caminhar seguro debaixo da mão do Onipotente. Ele pode sentir-se seguro nos braços do Todo-poderoso. Ele sabe que o futuro com Deus não é mais incerto.
  1. Deus Se revela a ele, dizendo-lhe que está perto dele (Gn.28:15) – “E eis que estou contigo, e te guardarei por onde quer que fores, e te farei tornar a esta terra, porque te não deixarei, até que te haja feito o que te tenho dito”. Jacó caminha solitário, com as emoções amassadas, com a alma perturbada, com um passado cheio de feridas e um futuro incerto. Mas, nessa jornada, tomou conhecimento de que, a despeito dos seus erros de percurso, Deus estava perto dele.
  1. Os anjos de Deus o assistem (Gn.28:12) – “E sonhou: e eis era posta na terra uma escada cujo topo tocava nos céus; e eis que os anjos de Deus subiam e desciam por ela”. Jacó pensou que estava só e desamparado, mas Deus estava perto dele, e os anjos de Deus estavam ao seu redor para o assistirem. O anjo do Senhor acampa-se ao nosso redor (Sl.34:7). Os anjos são espíritos ministradores que nos assistem na caminhada da vida (Hb.1:14). Os anjos de Deus subiam e desciam a escada mística que ligava a terra ao céu. Note que os anjos não desciam e subiam, mas subiam e desciam. Eles já estavam na Terra. Eles já estavam assistindo Jacó em sua jornada. Jacó descobriu que onde Deus está, ali é sua casa, “a porta dos céus” (Gn.28:13-17).
  1. Deus lhe promete bênçãos temporais (Gn.28:14,15) – “E a tua semente será como o pó da terra; e estender-se-á ao ocidente, e ao oriente, e ao norte, e ao sul; e em ti e na tua semente serão benditas todas as famílias da terra […] e te farei tornar a esta terra, porque te não deixarei, até que te haja feito o que te tenho dito”. Deus promete a Jacó três coisas maravilhosas: prosperidade, descendência numerosa e abençoada. Jacó, aliado à sua mãe, pensou que precisava ajudar Deus cumprir Sua promessa, mas, Deus estava no controle de tudo. A aparente demora de Deus é apenas um recurso pedagógico. As promessas de Deus jamais podem cair por terra. Nenhuma força no céu, na terra ou debaixo da terra pode anular os desígnios de Deus. O que Deus promete, Ele cumpre. Mesmo quando nos tornamos infiéis, Deus permanece fiel. Jacó estava fugindo, cabisbaixo, sob o fardo da culpa, mas Deus o encontra e faz-lhe promessas gloriosas.
  1. A coluna em Betel. Quando Jacó acordou de seu sono, depois de ter aquela magnífica visão da escada e dos anjos e, ao ficar aturdido pela glória da visão, exclama: “Realmente o Senhor está neste lugar; e eu não o sabia” (Gn.28:16). Jacó tem uma visão da presença manifesta de Deus. A presença manifesta de Deus nos causa profundos abalos. Jacó despejou sua admiração numa fervente exclamação: “Quão terrível é este lugar! Este não é outro lugar senão a casa de Deus; e esta é a porta dos céus” (Gn.28:17). Quando Moisés percebeu a presença manifesta de Deus no arbusto fumegante, no monte Sinai, ele se prostrou. Quando Isaías entrou no templo e viu a presença manifesta de Deus, assentado num alto e sublime trono, ficou aterrado. Quando Daniel ficou sozinho diante do ser celestial, seu corpo enfraqueceu; ele cai prostrado diante do fulgor do anjo (cf.Dn.10:8). Quando João viu o Senhor glorioso na ilha de Patmos, caiu aos seus pés. Diante da manifestação da glória de Deus os homens se prostram e se humilham. A glória de Deus é demais para o frágil ser humano suportar.
Tão impactante na sua vida foi aquele episódio, que Jacó chamou aquele lugar deserto de Betel, que significa “Casa de Deus” – “Então, levantou-se Jacó pela manhã, de madrugada, e tomou a pedra que tinha posto por sua cabeceira, e a pôs por coluna, e derramou azeite em cima dela. E chamou o nome daquele lugar Betel…” (Gn.28:18,19).
Sem dúvida alguma, a história de Jacó se divide em dois períodos: antes de Deus encontrá-lo e depois daquele encontro especial. Ali, naquela madrugada, Jacó ouviu Deus lhe falar, sentiu a presença divina e teve uma mudança extraordinária em sua vida.
III. ASPECTOS DO CARÁTER DE JACÓ
O caráter de Jacó teve duas fases – antes do seu encontro com Deus em Betel: oportunista, mentiroso e enganador; após o seu encontro com Deus em Betel: agradecido, paciente, trabalhador e cheio de fé.
  1. Antes do seu encontro com Deus. Até o encontro com Deus em Betel, Jacó tinha um comportamento reprovável. Ele enganou, mentiu, traiu. Ele praticou tudo isso porque era apenas um “homem natural”, ou carnal, pois um homem carnal não compreende as coisas espirituais (1Co.2:14). Vejamos alguns aspectos negativos de seu caráter antes do seu encontro com Deus.
a) Oportunista e egoísta. Num certo dia, quando Esaú voltava do campo, cansado, Jacó estava preparando um guisado vermelho. Esaú, então, pediu o guisado a Jacó e este, ardilosamente, resolveu atendê-lo, trocando o prato de lentilhas pela primogenitura de Esaú – “vende-me hoje a tua primogenitura” (Gn.25:31). Esaú, desprezando a bênção espiritual que tinha, alienou-o, demonstrando, com isso, que era uma pessoa profana (Hb.12:16), ou seja, que desprezava as bênçãos espirituais, sendo mais guiado pelo instinto, pela carnalidade (Gn.25:30-34).
b) Interesseiro e calculista. Além de propor a troca da primogenitura ao irmão, exigiu que Esaú fizesse um juramento que lhe garantisse que a troca seria respeitada por toda a vida: “Então, disse Jacó: Jura-me hoje. E jurou-lhe e vendeu a sua primogenitura a Jacó” (Gn.25:33; Hb.12:16). Com sua atitude ardilosa, Jacó demonstrava, assim, ser realmente um “suplantador”, pois conseguira obter para si a bênção que, por direito, pertencia a Esaú, tomando-lhe o lugar.
No entanto, é preciso observar que Jacó dava valor à bênção da primogenitura, à promessa divina de constituição de uma nação que faria benditas todas as famílias da terra, enquanto que Esaú simplesmente desprezava esta bênção espiritual, sendo pessoa presa às coisas desta vida, pessoa que não tinha qualquer consideração pela eternidade, pelo relacionamento com Deus. Portanto, Jacó desde o início de sua vida, mostrava-se apto para ser um patriarca, porque dava valor às coisas espirituais, porque, como diz o escritor aos hebreus, não tinha como alvo este mundo terreno, mas, sim, a cidade celestial, a vida eterna com Deus (Hb.11:9,10,13-16). Neste sentido, aliás, temos aqui o outro significado de “suplantador”, ou seja, “aquele que se supera”, aquele que quer ir além da posição onde se encontra. Na Sua presciência, Deus amou Jacó precisamente por causa do valor que Jacó dava ao relacionamento com o Senhor.
c) Mentiroso e enganador. Duas características sumamente reprováveis. Jacó aprendeu a ser assim dentro da casa de seus pais. Jacó, movido pela vontade inflexível de sua mãe, enganou seu velho pai; mentiu, forjando sua identidade; passou-se por Esaú; blasfemou contra Deus e deu um beijo de mentira em seu pai (Gn.27:18-20,24,26,27). Ele aprendeu com a mãe e, daí para a frente, viveu como um suplantador, um enganador.
O lar é um campo de semeadura – nós colhemos o que plantamos, refletimos quem somos em nossos filhos. Porque Isaque e Rebeca plantaram a falta de diálogo, seus filhos cresceram sem amizade. Porque Isaque e Rebeca tinham preferências, seus filhos cresceram como rivais. Porque Isaque e Rebeca semearam competição entre os filhos, eles colheram o ódio de Esaú por Jacó. Porque eles não cultivaram amizade entre os filhos, passaram a velhice na solidão, longe dos filhos.
Jacó precisou fugir de casa. Saiu como mentiroso, traidor, embusteiro. Saiu com a consciência culpada, deixando um pai enganado, um irmão traído e uma mãe protetora fracassada. Jacó perdeu a casa, perdeu a mãe protetora, perdeu o amor do irmão e a consciência tranquila. Vinte anos depois, Deus restaurou a amizade de Jacó e Esaú, mas Rebeca não viu isso, e o pai estava muito velho para alegrar-se nessa restauração. Peça a Deus que faça você ver um milagre em sua família.
  1. Depois do seu encontro com Deus. Após essa primeira experiência que Jacó teve com Deus em Betel, quando ia em direção a Harã, o seu caráter passou a demonstrar um perfil diferente do que era antes. A presença manifesta de Deus causa profundos abalos na vida do ser humano. Observe a transformação no caráter de Jacó após o seu primeiro encontro com Deus em Betel:
a) um caráter agradecido. Após a experiência sobrenatural da visão da escada, Jacó passou a ver as coisas numa perspectiva espiritual de um novo relacionamento com Deus e fez-lhe um voto, dizendo: “… se Deus for comigo, e me guardar nesta viagem que faço, e me der pão para comer e vestes para vestir, e eu em paz tornar à casa de meu pai, o SENHOR será o meu Deus; e esta pedra, que tenho posto por coluna, será Casa de Deus; e, de tudo quanto me deres, certamente te darei o dízimo”.
Aqui, o texto trata de um voto, ou uma obrigação que Jacó assumiu com Deus. Na Bíblia, um voto é geralmente uma oração em que o indivíduo se compromete a fazer alguma coisa quando Deus atende suas orações. Isso era realizado principalmente em tempos de intensa necessidade ou perigo. Havia dois tipos de votos: (1) o voto incondicional, no qual o povo se comprometia a fazer algo para o Senhor sem pedir nenhuma bênção específica, que era o caso do voto dos nazireus (Nm.6:2); e (2) o voto condicional, que seria cumprido se o favor solicitado fosse concedido (1Sm.1:11). A prática era baseada no princípio da reciprocidade: um favor recebido requer uma expressão de gratidão; a pessoa que recebe algo, por meio de sua oferta, transforma-se em doadora. Isso não era uma tentativa de barganhar com Deus, mas o desejo de ter intimidade e relacionamento com Ele. Deus é considerado alguém com quem se pode conversar e pedir um favor, e alguém para quem se pode fazer uma promessa de retribuir Sua bondade. As pessoas sabiam que Deus podia escolher não conceder a petição, o que tornava desnecessário o cumprimento do voto.
Jacó, em seu voto, pediu a presença divina para protegê-lo e para retornar a salvo. Se isso lhe fosse concedido, o Senhor seria o seu Deus e ele lhe daria o dízimo de tudo quanto Deus lhe desse. Observe que Deus já havia prometido a Jacó, em sonho, o que ele estava pedindo, e muito mais. Deus já havia prometido que lhe daria o lugar em que estava dormindo, que multiplicaria seus descendentes, que todos os povos seriam abençoados por meio dele e que estaria com ele para protegê-lo (Gn.28:13-15). Então, por que Jacó não confiou nas promessas de Deus sem recorrer à “garantia” do voto? Talvez porque Jacó ainda não tinha maturidade espiritual plena, ou seja, ele ainda não tinha um compromisso total com o Senhor.
O voto de Jacó foi uma experiência que o levou a assumir um compromisso pessoal com o plano de Deus para ele e seus descendentes. Deus lida conosco de acordo com nossa condição espiritual e, se desejarmos, Ele pacientemente nos conduz a um relacionamento mais profundo e pessoal com Ele como nosso Redentor.
– No voto, ele disse: “Então o Senhor será o meu Deus” (Gn.28:21). Vendo esta atitude de Jacó, Deus Se identificou como “o Deus de seu pai Abraão e o Deus de Isaque” (Gn.28:13). Ele ainda não era o Deus de Jacó; foi Seu cuidado providencial que resultou na conversão desse patriarca. Deus o abençoou tão abundantemente enquanto trabalhava para Labão que ele disse: “Foi assim que Deus tirou os rebanhos de seu pai e os deu a mim” (Gn.31:9). O Senhor também protegeu a Jacó em seus negócios com Labão (Gn.31:22-24) e durante seu encontro com Esaú (Gn.33:1-5). Finalmente, o Senhor enviou Jacó de volta à terra de Canaã com a promessa de Sua presença (Gn.31:3). Nesse momento da história, Jacó escolhe o Senhor como seu Deus; o Senhor agora era o Deus de Abraão, Isaque e Jacó. Este já não era mais Jacó, e sim Israel (Gn.32:24-30). Em Canaã, ele construiu um altar e adorou ao Senhor (Gn.33:20).
– No voto, também, ele disse que daria o dízimo de tudo que Deus desse para ele. Até ali Jacó nunca teve renda própria, morava na casa de seu pai, não tinha salário. Agora Jacó está iniciando sua vida própria. Terá que viver e sobreviver do trabalho de suas mãos. Ao contrário do que muitos pensam, ele não disse “se eu ficar rico”, ou “se eu ganhar muito dinheiro”. Não foi esta a sua oração. Ele não usou o Dízimo como instrumento de troca. Ele pediu a Deus o básico, as condições necessárias para a sua sobrevivência: alimento e roupa. Ele prometeu dar o dízimo “de tudo quanto me deres”, ou seja, pouco ou muito. O Dízimo nunca teve o objetivo de ser um instrumento para gerar riquezas; ele deve ser exercitado como uma prova de obediência e de fé.
b) um caráter esforçado e sofredor. Chegando a Harã, Jacó logo foi querendo saber onde morava a família de Labão, seu tio, e, nesta procura, encontrou-se com Raquel, sua prima, de quem logo se enamorou, tendo-a pedido em casamento a seu tio Labão e, como não tinha qualquer patrimônio, dispôs-se a trabalhar sete anos por ela (Gn.29:1-20). Passados os sete anos de trabalho, Jacó, então, foi enganado por seu tio Labão, pois, após a festa do casamento, acabou por dormir com Leia e não com Raquel, pois não sabia que, em Padã-Harã, não se podia casar a filha mais nova antes da mais velha. Jacó começa, assim, a sofrer as consequências de seu pecado, ao enganar seu pai, sendo, também, enganado. Teve, então, de trabalhar mais sete anos para poder casar com Raquel (Gn.29:21-27). Temos aqui a chamada “lei da ceifa”, bem descrita em Gl.6:7: “Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará”. Temos aqui mais uma prova de que não foi o engano, que ele cometeu junto ao seu pai, que deu a bênção a Jacó, tanto que este engano fez com que ele fosse seguidamente enganado por seu tio Labão.
Mas há, ainda, um outro fator que levou Jacó a ser enganado: a falta de vigilância e de comunhão com Deus. Deus havia Se manifestado a Jacó em Betel, havia lhe confirmado sua condição de herdeiro da promessa de Abraão, mas, desde que Jacó chegou a Harã, em momento algum vemos Jacó adorando a Deus, em momento algum vemos Jacó edificando um altar ao Senhor. Jacó passou vinte anos em Harã (cf. Gn.31:38) e, durante todo este tempo, não ofereceu qualquer sacrifício a Deus, nem sequer educou seus filhos na doutrina e admoestação do Senhor. Ora, quem não tem qualquer relacionamento com Deus, acaba por se comprometer com este mundo e, assim, acaba enganando e sendo enganado, indo de mal a pior (2Tm.3:13).
c) Um homem na direção de Deus. Jacó havia se esquecido de Deus, mas Deus não havia Se esquecido de Jacó. Apesar da indiferença demonstrada por Jacó para com as coisas relacionadas a Deus e que havia se restringido tão somente à observância da circuncisão de seus filhos (cf. Gn.34:14) durante aqueles vinte anos em que estivera em Padã-Arã, Deus vai ao encontro do patriarca e, no momento da angústia e aflição, manda-lhe voltar para Canaã. Jacó chamou, então, sua família e lhe relatou o ocorrido, dizendo que o Senhor lhe dissera que havia sido Ele quem providenciara a transferência patrimonial para Jacó em detrimento de Labão e que deveria retornar a Betel, inclusive para cumprir o voto que fez em Betel (Gn.31:4-13).
Ao saber da fuga de Jacó, Labão foi ao seu encalço e o fez principalmente por causa dos ídolos que lhe haviam sido roubados. Estes ídolos, como explicam os historiadores e arqueólogos, representavam a posse e propriedade da terra, e Labão achou que Jacó havia partido mas reivindicaria, posteriormente, todas as terras de Labão. Labão não achou os ídolos, pois Raquel simulou estar menstruada e não se levantou onde eles estavam, o que causou a ira de Jacó. No entanto, Jacó e Labão fizeram um concerto, segundo o qual Jacó não reivindicaria jamais as terras de Labão e Labão, a terra de Canaã (Gn.31:22-55). Aliás, Labão não podia praticar nenhum mal a Jacó, porque Deus entrou em ação e lhe determinou que não falasse com Jacó “nem bem nem mal” (Gn.31:24). Deus age ainda assim conosco. Deus quer que os homens se salvem e, por isso, vai ao encontro do homem querendo que ele se arrependa de seus pecados. Quão grande é o amor de Deus!
Na volta para Canaã, Jacó viu anjos de Deus (Gn.32:1), uma confirmação divina para o patriarca, uma confirmação de que estava a fazer a vontade de Deus. Assim como ocorrera com seu avô Abraão, Jacó teve uma visão das coisas espirituais depois que se desvencilhou de aspectos de sua vida que não eram agradáveis a Deus. Quando nos aproximamos de Deus, quando nos santificamos, quando eliminamos aspectos de nossa vida que não agradam ao Senhor, temos nossa visão mais nítida para as coisas dos céus. Por isso, como disse o salmista Asafe, boa coisa é nos aproximarmos do Senhor (Sl.73:28).
  1. No seu encontro com Esaú. Jacó sabia que tinha uma questão pendente na sua volta para Canaã: a relação com seu irmão Esaú. Sabia que o relacionamento havia se desfeito em virtude da mentira com que obtivera a bênção de seu pai, mas Jacó estava determinado a superar esta situação e, por isso, mandou mensageiros a Esaú, que já habitava em Seir neste tempo, dizendo-se servo dele e relatando que havia obtido um patrimônio enquanto tinha estado em Padã-Arã. Os mensageiros retornaram, dizendo a Jacó que Esaú vinha ao seu encontro (Gn.32:2-6). Jacó, então teve medo e se angustiou muito, pois se lembrou da intenção homicida de seu irmão.
O pecado sempre gera terror e morte. Jacó sabia que não havia se conduzido bem. Por isso, esperando o pior, Jacó repartiu seu povo em dois bandos, a fim de que, pelo menos, metade de seu povo escapasse de Esaú. Simultaneamente, orou a Deus, pedindo-lhe ajuda, algo que jamais havia feito em Padã-Arã. Jacó, com isso, dá uma grande e profunda lição: a oração não é só clamor a Deus, mas também ação. Devemos fazer aquilo que depende de nós e confiar em Deus para que o que não podemos fazer, Ele o faça em nosso favor. Temos agido assim?
Também, com o objetivo de aplacar a ira de Esaú, Jacó enviou presentes para ele (Gn.32:7-21). Ao encontrar seu irmão, reconciliou-se com ele e o abraçou com perdão e amor.
  1. A plena mudança do caráter de Jacó. Após passar o seu povo pelo vau de Jaboque, dividido em dois bandos, ele ficou sozinho ali, certamente para buscar a presença de Deus, em continuidade à sua oração por livramento (Gn.32:22-24). No vau de Jaboque, porém, apareceu um varão com quem Jacó lutou. A luta durou toda a noite e, vendo o varão que não conseguia prevalecer contra Jacó, deslocou a juntura da coxa de Jacó, deixando-o, pois, coxo. Mesmo coxo, porém, Jacó não deixou escapar aquele varão, que teve, então, de pedir que o deixasse partir, o que Jacó concordou desde que fosse abençoado por este varão. Entretanto, aquele varão, antes de o abençoar, mandou que dissesse qual era o seu nome. Jacó confessa o seu nome: suplantador. Nesta confissão, Jacó reconhece que havia vivido a enganar e a ser enganado até então. A bênção de Deus nunca vem na sua plenitude se não houver confissão e arrependimento. Como diz o proverbista: “O que encobre as suas transgressões nunca prosperará; mas o que as confessa e deixa alcançará misericórdia” (Pv.28:13).
Aquele varão, então, diante de tal confissão, mudou o nome do patriarca para Israel, nome cujo significado é “aquele que luta com Deus”, porque “como príncipe lutaste com Deus e com os homens e prevaleceste” (Gn.32:28). Estava retirado o último ponto que impedia Jacó de desfrutar da plenitude da promessa de Abraão.
Jacó ainda quis saber o nome daquele varão, mas este não o disse, tendo, então, partido. Com certeza, esse varão outro não é senão o Senhor Jesus em mais uma das chamadas “manifestações teofônicas”, ou seja, aparições antes de Sua encarnação. Como podemos saber que este varão é o Senhor Jesus? Pelo fato de ter abençoado Jacó (e anjo jamais abençoa), como também pela própria circunstância de lhe ter sido dado o nome de Israel, ou seja, “aquele que luta com Deus”. Ora, isto nos mostra, com clareza, que quem lutou com Jacó foi o Senhor Jesus. O próprio Jacó teve esta percepção, tanto que chamou aquele lugar de Peniel, que significa “a face de Deus”, admitindo ter visto Deus face a face e ter sido salvo (Gn.32:30). Jacó ficara coxo mas tinha tido o seu caráter completamente mudado com aquela rica experiência espiritual.
IV. ALGUMAS VERDADES IMPORTANTES QUE A VIDA DE JACÓ NOS REVELA
Adaptado do livro “Quatro homens e um destino”, do Rev. Hernandes Dias Lopes.
  1. Deus amou Jacó, apesar de seus pecados (Gn.25:23). O nome de Jacó era um retrato de sua personalidade. Jacó significa enganador, mentiroso. Ele enganou seu pai e seu irmão. A despeito de quem ele era, Deus o escolheu. Mesmo Deus nos conhecendo como somos, ainda nos ama. Esse é um glorioso mistério! Não há nenhum mérito nosso que justifique o amor de Deus por nós. Nossos atos de justiça são, aos Seus olhos, como trapos de imundícia (Is.64:8). O homem sem Deus está morto, escravizado, depravado e condenado (Ef.2:1-3). O espantoso da graça de Deus é que Ele ama com amor eterno os filhos da ira. Ele aplacou Sua própria ira, satisfazendo Sua justiça no sacrifício perfeito e substitutivo do Seu Filho na cruz.
  1. Jacó reconheceu sua necessidade de salvação (Gn.32:26) – “E disse: Deixa-me ir, porque já a alva subiu. Porém ele disse: Não te deixarei ir, se me não abençoares”. Observe que Jacó se agarrou ao Senhor e disse: “Não te deixarei ir, se não me abençoares”. Os olhos da alma de Jacó foram abertos para compreender que a maior necessidade de sua vida não era de riqueza nem mesmo de ter uma família numerosa e próspera, mas de ter Deus. Deus sem Jacó é Deus, mas Jacó sem Deus não é ninguém. Deus não precisa de nós, pois sempre e eternamente subsistiu como Deus perfeito em Si mesmo. Mas nós, sem Deus, somos um ser vazio, insatisfeito, incompleto, menos do que nada.
  1. Jacó chorou buscando a transformação de sua vida (Os.12:4) – “Como príncipe, lutou com o anjo e prevaleceu; chorou e lhe suplicou; em Betel o achou, e ali falou conosco”. O coração do velho Jacó agora se derrete. A resistência acaba. O homem endurecido se quebranta. Aquele que era crente apenas de nome, agora se dobra e chora diante de Deus. Quando uma criança entra no mundo, seu sinal de vida é o choro. O choro é sinal de vida. Quando um coração endurecido é quebrado, e quando os olhos da alma são abertos para a nova vida em Cristo, o choro do arrependimento sincero explode como sinal de genuína conversão.
  1. Jacó confessou seu pecado a Deus (Gn.32:27) – “E disse-lhe: Qual é o teu nome? E ele disse: Jacó”. Deus lhe pergunta: qual é o seu nome? Quando seu pai lhe fez essa pergunta, Jacó mentiu dizendo que era Esaú. Agora, Deus lhe pergunta de novo. Não que o Senhor não soubesse o nome dele. Deus estava lhe dando a oportunidade para ele reconhecer o seu pecado, sua identidade. Ele, então, disse: “Jacó”. Aquela não foi uma resposta, mas uma confissão. O nome Jacó significa enganador, suplantador. Ele era um retrato de seu próprio nome. Ninguém pode ser salvo antes de reconhecer que é pecador. Jesus Cristo não veio chamar justos, mas pecadores. O médico celestial não veio para os que se julgam sãos, mas para os enfermos. No céu, só entrarão os arrependidos, aqueles que reconhecem que carecem totalmente da graça de Deus.
  1. Jacó viu Deus face a face, e foi salvo (Gn.32:30) – E chamou Jacó o nome daquele lugar Peniel, porque dizia: Tenho visto a Deus face a face, e a minha alma foi salva”. Não basta apenas ouvir falar de Deus, é preciso ver Deus face a face, é preciso ter uma experiência com Deus. Devido essa grandiosa experiência, Jacó chamou aquele lugar de Peniel, que significa “a face de Deus”, admitindo ter visto Deus face a face e ter sido salvo (Gn.32:30). Em Peniel, Jacó encontrou-se com Deus e consigo mesmo, e sua vida foi salva. O supremo propósito da vida é ver Deus. O céu é a casa do Pai. O objetivo de Jesus é nos levar ao Pai. Quando o véu da incredulidade é removido de nosso rosto, e as escamas caem dos nossos olhos, então, pela fé, contemplamos a face sorridente de Deus. Ele corre para nos abraçar e fazer uma grande festa pela nossa volta ao lar.
CONCLUSÃO
Jacó, por causa do seu caráter deformado, foi necessário trilhar uma longa jornada até se tornar um homem transformado e apto. Apesar da sua vida de enganos e de mentiras, Jacó encontrou-se com Deus de uma forma maravilhosa no vau de Jaboque (Gn.32:22-32), quando, então, teve mudado o seu caráter. Observemos que Deus Se manifestou a Jacó em Betel, quando ele ia para a casa de seu tio Labão, em Padã-Arã, mas Jacó somente teve um encontro real e transformador com Deus muitos anos depois (cerca de vinte anos), no vau de Jaboque. Há, portanto, uma diferença crucial entre tomar conhecimento da existência e da vontade de Deus e deixar que a vontade de Deus se cumpra nas nossas vidas, e somente quem age da segunda maneira é que desfrutará da vida eterna. Ainda que alguém tenha feito maravilhas no nome do Senhor, somente alcançará a vitória se fizer a sua vontade (Mt.7:20-23).
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Luciano de Paula Lourenço
Disponível no Blog: http://luloure.blogspot.com
Referências Bibliográficas:
Bíblia de Estudo Pentecostal.
Bíblia de estudo – Aplicação Pessoal.
Comentário Bíblico popular (Antigo e Novo Testamento) – William Macdonald.
Comentário do Novo Testamento – Aplicação Pessoal. CPAD.
Revista Ensinador Cristão – nº 70. CPAD.
Comentário Bíblico Pentecostal. Novo Testamento. CPAD.
Pr. Elinaldo Renovato de Lima. O caráter do Cristão. CPAD.
Paul Hoff. O Pentateuco.
Bruce K. Waltke. Gênesis. Editora Cultura Cristã.
Ev. Caramuru Afonso Francisco.  Jacó, o suplantador, que se torna Israel, o príncipe que luta com Deus e prevalece. PoratalEbd_2015.
Rev. Hernandes Dias Lopes. Quatro Homens e um destinto

07/04/2017

Lição 2 - Abel, Exemplo de Caráter que Agrada a Deus



INTRODUÇÃO
Nesta lição analisaremos a definição da palavra caráter; estudaremos a pessoa de Caim e Abel como dois tipos de adoradores opostos; pontuaremos Abel como um grande exemplo de um verdadeiro adorador, e por fim, comentaremos sobre quais as lições que Abel nos deixou com sua vida piedosa e obediente.

I – DEFINIÇÃO DA PALAVRA CARÁTER

1.1 Definição da palavra caráter. Segundo o dicionário Aurélio caráter é: “formação moral; honestidade, caracterização do próprio sujeito; índole, humor, temperamento, traço distintivo; conjunto de características que, sendo boas ou más, distinguem uma pessoa, um povo”. O caráter refere-se ao aspecto fisiológico ou morfológico usado para diferenciar os seres em diferentes espécies ou numa mesma espécie. Reunião de caracteres psicológicos comuns que compõem um indivíduo ou um grupo de pessoas (FERREIRA, 2004, p. 402).

II – CAIM E ABEL: DOIS TIPOS DE ADORADORES
Caim e Abel foram as primeiras crianças citadas na Bíblia (Gn 4.1-2). Como irmãos, foram criados por seus pais, Adão e Eva, recebendo os mesmos ensinamentos e educação. A principal diferença entre os dois é que Abel agradou a Deus, mas Caim não. Com os ensinos ministrados pelos pais, tanto Caim como Abel, sabiam a vontade de Deus, de como agradá-lo; apenas Abel obedeceu. O autor da epístola aos Hebreus dá-nos uma explicação inspirada da diferença entre as duas ofertas: “Pela fé Abel ofereceu a Deus maior sacrifício do que Caim […] dando Deus testemunho dos seus dons” (Hb 11.4). Esta explicação centraliza-se sobre a diferença do espírito manifestado pelos dois irmãos. Notemos:

2.1 Abel um adorador com intenções certas, e motivações certas (Hb 11.4). Pelas aparências, ambas as ofertas, a de Abel e Caim, expressavam ação de graças e devoção a Deus. Mas, o que parece é que Caim tinha falta de fé genuína no seu coração e por isso não podia agradar a Deus, embora sua oferta material fosse aceitável. Deus não se agradou de Caim porque olhara para ele e vira o que havia no seu coração. Todavia, Abel veio a Deus com a atitude certa de um coração disposto a adorar, logo “o sacrifício de Caim foi inferior porque a motivação deste não era boa, e a de Abel sim”.

2.2 Caim um adorador com intenções certas, mas motivações erradas (Gn 4.3,4). É provável que Caim só refletiu superficialmente na sua oferta e a apresentou por mera formalidade, mas Deus não aprova a simples adoração formal.
Caim havia desenvolvido uma péssima atitude de adorador, o Senhor discerniu que ele tinha motivações erradas. A palavra motivação alude a intenção, propósito ou objetivo com que fazemos as coisas. Jesus exortou seus seguidores a não fazerem as coisas certas com motivações erradas (Mt 6.2,5,16). Caim e Abel trouxeram ofertas ao Senhor, todavia, enquanto a motivação de Abel era boa, a motivação de Caim não era (Gn 4.7). Sob a análise divina a oferta tem valor secundário, enquanto que o ofertante tem valor primário (Is 1.11-17; Mq 6.6-8; Ml 1.6-14; Lc 21.1-4; 18.10-14). A diferença entre a oferta de Caim e de Abel não era o produto em si, mas o modo como foram apresentadas.

III – CAIM: UM MAL EXEMPLO DE ADORADOR

3.1 Antes de atentar para a oferta, Deus atenta para o ofertante (Gn 4.3-5). Fica claro que Deus atenta primeiramente para o homem e depois para a oferta. Nada que possamos oferecer a Deus pode comprá-lo. Ele não receberá uma oferta de procedência duvidosa (Dt 23.18), nem aquela dada como se fosse uma obrigação incômoda (2Co 9.7). A visão de Deus se uma oferta é correta ou não, está mais ligada ao coração daquele que ofertou do que com a oferta em si. Observe que Deus se agradou “de Abel e de sua oferta”. Primeiro o Senhor olhou para o coração de Abel, e depois observou que sua oferta era adequada. Da mesma forma Deus não se agradou “de Caim e de sua oferta”. A atitude de Caim após a rejeição de sua oferta mostrou o que de verdade ele tinha em seu coração: “Não como Caim, que era do maligno e matou a seu irmão. E por que causa o matou? Porque as suas obras eram más, e as de seu irmão, justas.” (1Jo 3.12).
 
3.2 Abel ofereceu a Deus o melhor que tinha, enquanto Caim não (Jd 11-a). Caim não foi rejeitado por causa da oferta que escolheu, mas sua oferta foi rejeitada por causa de Caim, pois seu coração não estava em ordem com Deus. A Bíblia nos mostra que Deus observa o coração do ofertante (Is 1.11-20; Mt 5.23-26). Muitos anos depois, a lei de Moisés prescreveu a oferta de grãos e de frutas (Lv 2; Dt 26:1-11), de modo que não temos motivos para acreditar que tais ofertas (de cereais) não eram aceitáveis desde o princípio. Contudo, mesmo que Caim tivesse sacrificado animais e derramado o sangue deles, não teriam sido aceitáveis para Deus por causa da disposição do coração de Caim. Abel trouxe o que tinha de melhor e procurou verdadeiramente agradar a Deus; Caim, porém, não teve essa atitude de fé (1Sm 15.22; Is 1.11-13; Os 6.6; Mq 6.6-8; Mc 12.28-34, 41-44)” (WIERSBE, 2010, p. 43).

3.3 Caim jamais experimentou um relacionamento verdadeiro com o Senhor. Sem um coração submisso, nem mesmo as mais preciosas ofertas podem tornar o adorador aceitável diante de Deus (Sl 51.16, 17; 2Tm 3.5). O Senhor usando o profeta Isaías disse: “Este povo se aproxima de mim e com a sua boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim” (ls 29.1 3; Mt 15.8). O caminho de Caim é o caminho da vontade própria e da incredulidade (Jd 11) (WIERSBE, 2010, p. 44). Caim representa a humanidade caída, pecadora e fugitiva da presença de Deus: “E saiu Caim de diante da face do Senhor […]” (Gn 4.16). O rei Salomão disse: “O sacrifício dos ímpios é abominação; quanto mais oferecendo-o com intenção maligna!” (Pv 21.27). Somente quando são oferecidos com fé, os sacrifícios e o serviço dos homens agradam a Deus (Is 1.11-17; Ml 1.6-14).

3.4 Caim foi o agricultor que sabia cuidar da terra mas não do seu espírito (Gn 4.2). Caim aprendeu com o seu pai Adão, a arte da agricultura e certamente foi um bom lavrador da terra, porém não adiantava ser um bom lavrador da terra se o seu coração era voltado para o mal. Caim foi recebido em seu lar como uma bênção de Deus (Gn 4.1), e assim poderia ter sido se tivesse buscado servi-lo. Ele se afastou de Deus, e, por conseguinte, todos os seus descendentes caíram em desgraça, por isso foram destruídos no dilúvio (Gn 6.13). Judas nos exorta que evitemos nos apartar do Deus vivo, pois este caminho conduz, inevitavelmente, à destruição (Jd 11-13). Apesar das honras que lhe conferiam a primogenitura, Caim deixou-se dominar por uma inveja tola e injustificável. Como primeiro filho de Adão, cabia-lhe, entre outras coisas, a herança messiânica se tivesse permanecido fiel, estaria hoje entre os ancestrais de Cristo.

IV – ABEL: EXEMPLO DE UM VERDADEIRO ADORADOR
Abel pode ser um derivado do vocábulo hebraico que significa: “sopro, fôlego, vapor, respiração”, possivelmente para prefigurar assim que sua vida seria curta (GARDNER, 1999, p. 11 – acréscimo nosso). Abel é lembrado nas Escrituras como um homem de fé, um homem de Deus, alguém de destaque (Hb 11.4). Embora saibamos muito pouco dele, o pouco que nos é revelado é suficiente para nos mostrar alguém especial e agradável aos olhos de Deus (Gn 4.2-9; Mt 23.35; Lc 11.51; Hb 11.4, 12.24). Diante disso, comentaristas tem afirmado que Abel é, sem dúvidas, um exemplo para os cristãos em todos os tempos.

4.1 Abel: um exemplo de verdadeiro adorador. O termo “primícias” no AT é usado correspondentemente em relação a produtos da terra (Gn 49.3; Êx 23.16,19; 34.22, 26; Lv 2.12, 4; 23.10,17,20; Nm 15.20,21; Dt 18.4, 21.17) da mesma forma como os “primogênitos” eram os mais preciosos entre os animais, as “primícias” o eram entre os cereais. A ausência do termo primícias em relação a oferta de Caim mostra que a sua oferta foi de pouca qualidade em contraste com o melhor que Abel havia trazido, Caim simplesmente trouxe a Deus algo sem importância. Ao ofertar, Caim trouxe uma oferta “comum” para Deus, e quando Abel traz sua oferta, a Bíblia faz questão em explicitar que não se tratava de uma oferta comum, mas dos primogênitos, ou seja, os primeiros animais nascidos. Enquanto a oferta de Abel foi com fé e zelo, a de Caim foi sem compromisso e desprezo (BROADMAN, 1987, p. 187).

4.2 Abel: um exemplo de adorador com caráter. O crente verdadeiro e o não verdadeiro são diferenciados por suas atitudes básicas em relação a Deus. Embora as Escrituras não contenham nem uma única palavra proferida por Abel, ele “ainda fala” por intermédio de seu caráter exemplar (Hb 11.4). Seu sangue, que “clamava a Deus desde o solo”, não foi esquecido (Gn 4.10; Lc 11.48-51). Jesus fala do caráter de Abel em Mateus 23.34-35, e com esses dois versos aprendemos três lições: a) Que Jesus reputava a Abel como um profeta: “eis que eu vos envio profetas…”; b) Que Jesus reputava a Abel como um mártir: “…o sangue justo derramado sobre a terra”; e c) Que Jesus reputava Abel como Justo: “… desde o sangue do justo Abel até ao sangue de Zacarias”. Duas vezes Jesus usa o termo “justo” do grego “dikaiós” para descrever a Abel, uma vez em referência a seu sangue e outro em relação a sua pessoa.

4.3 Abel: um exemplo de adorador que tinha uma visão de Deus. Abel não viveu uma vida-longa, mas uma vida que se prolonga até hoje. Foi o primeiro a ser assassinado, e o foi exatamente por causa da visão que tinha de adorador. Caim e Abel ambos haviam recebido a vida, saúde e condições de trabalhar. Ambos foram abençoados em seu trabalho, ambos criam em Deus, mas a visão de adorador foi diferente. A oferta de Abel era uma oferta das suas primícias. O termo hebraico “bekowrah” é usado poucas vezes no AT, e normalmente significa primogênito (Gn 43.33), ou até mesmo primogenitura (Gn 25.31). A ideia que se tem desse texto é que Abel trouxe o que tinha de melhor. Caim por sua vez lembrou-se do culto, mas não preocupou-se em dar o melhor, pegou qualquer coisa dos produtos da terra e ofertou ao Senhor (Gn 4.3-5).

CONCLUSÃO
Concluímos que o pecado de Adão e Eva não causou infortúnio apenas para suas vidas, mas passou de pai para filho, de geração para geração. Somos advertidos pelo mau exemplo de Caim, a não trilharmos o seu caminho de impiedade, nem imitarmos as suas obras injustas, mas vivermos uma vida de caráter que agrade a Deus como fez Abel.

REFERÊNCIAS
CHAMPLIN, R. N. O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo. HAGNOS.
GARDNER, Paul. Quem é quem na Bíblia Sagrada. VIDA.
RADMACHER, Earl D. Et al. O Novo Comentário Bíblico: AT. CENTRAL GOSPEL.
STAMPS, Donald C. Bíblia de Estudo Pentecostal. CPAD.
WIERSBE, Warren W. Comentario Biblico Espositivo do Antigo Testamento. PDF
Publicado no Portal da Rede Brasil de Comunicação